Convergências significantes

Uma que me aconteceu hoje: um velhote, enquanto espera pela sua vez na fila do supermercado tira do bolso 2 sacos de plástico: um saco verde e um rosa. Eu estou à sua frente na fila enquanto, à minha frente a ser atendida, está uma rapariga preta.
A funcionária pergunta-lhe com grande à vontade (porque claramente já o conhece) se tem dúvidas em relação à cor do saco.
O senhor não responde imediatamente e só quando a rapariga preta se vai embora é que responde com as maiores das calmas:

- Eu ia-lhe dizer que não sou racista e que estava a escolher pelo tamanho e, 'tá a ver o rosa é mais pequeno que o verde serve melhor hoje, mas estava a rapariga aí à frente e eu não quis que ela pensasse coisas...

Enquanto isto olha para mim (eu só o vejo pelo canto do olho e já sinto o gasganete a apertar-se-me para uma resposta de «'tás aqui, 'tás ali») à procura de aprovação enquanto continua:

- A vida está mal para a juventude, agora é muito difícil...


Eu não consigo olhar para ele. Se lhe respondesse, por onde começaria? E que eco isso iria provocar? Se calhar isso mesmo, eco!



Tudo isto a propósito deste texto.

Ali como aqui mostra-se bem escarrapachado o preconceito abafado (com o rabo de fora) pela «modernidade», a estupidez disfarçada de graça, a mediocridade, a tacanhez... como se isso fosse tudo normal, não pessoal... como se tudo fosse «sem sentimentos».